segunda-feira, 11 de abril de 2011

CONVERSAS



Com Iole Sala, casada, duas filhas, formada em economia. Trabalhei na L'Oréal durante 10 anos. Trabalho na Pondera, empresa de relações públicas e projectos editoriais na área da cosmética e sou uma apaixonada por jardins.
Tu és italiana, mas eu quando falo contigo não me lembro disso. O que significa que também te sentes portuguesa?
Vim paraPortugal aos 8 anos e aqui estudei e vivi a maior parte da minha vida. Aqui casei e nasceram as minhas filhas.
Sinto-me europeia. Estudei no liceu francês até ao fim do liceu, estudei na Universidade Católica,depois em Bolonha e em França. Também vivi 4 anos em França e dois na Argentina. Aí percebi que sou europeia.
Porque é que a Argentina te fez sentir tão europeia?
Porque o modo de vida dos argentinos é muito diferente do nosso, tem mais a ver com a América. As pessoas não têm a mesma visão do mundo e da historia, tudo é muito recente para eles.
Desiluidiu-te muito viver lá?
Senti, pela primeira vez, que era estrangeira. Tirei um curso de cultura argentina para tentar perceber melhor o país (e aprender espanhol) e percebi que eles, apesar de serem argentinos de segunda ou terceira geração, olham para a Europa como os conquistadores, os invasores. Sentem-se colonizados, têm necessidade de afirmação. De resto, adorei lá viver porque Buenos Aires é uma cidade linda e interessante culturalmente e a natureza é espantosa. Foi lá que aprendi a cuidar de um jardim, tudo cresce com exuberância, a terra é fertilíssima.
Vamos começar a falar de jardins.Porque te interessam tanto, o que fazes pelos jardins?
Gosto de jardins porque são bonitos, porque me fazem sentir bem. Nasci nos Alpes italianos, nos Dolomiti, um lugar de grande beleza, numa pequena aldeia no meio das montanhas e dos bosques. Talvez por isso precise de natureza e de beleza. Numa cidade, só os jardins me dão o bem-estar de que preciso. Quando voltei da Argentina, em 1995, deixei de ter jardim. Só tenho um pequeno quintal. Tive a sorte de poder trabalhar na reabertura ao público do Jardim Botânico da Ajuda. Aí criei a Associação dos Amigos do Jardim Botânico da Ajuda, que ainda existe e tem imensas actividades interessantes. Depois disso, e depois de um trabalho de inventariação dos jardins históricos portugueses encomendado pelo Fundo de Turismo (actual Turismo de Portugal), a equipa que fez o trabalho, coordenado pela arq. paisagista Cristina Castel-Branco, fundou a Associação Portuguesa de Jardins e Sítios Históricos. Esta Associação tem por objectivo apoiar os proprietários de jardins na difícil tarefa de os manter vivos. Tanto os privados como os públicos têm encargos elevadíssimos de manutenção, cada vez mais difíceis de suportar. Um jardim histórico faz parte do património cultural do país, e como tal devia ser apoiado.
Quais são as actividades da associação?
Os membros da associação, cerca de 200 actualmente, são proprietários de jardins, pessoas que profissionalmente trabalham com jardins (arquitectos, paisagistas, engenheiros agrónomos, engenheiros hidráulicos, viveiristas, editores de revistas, pessoas ligadas ao turismo e pessoas que simplemente gostam de jardins e de os conhecer melhor. Temos por isso cursos de jardinagem, passeios guiados a jardins, viagens temáticas, workshops, almoços...
Mas sendo o principal objectivo a divulgação e a manutenção dos jardins, também temos projectos de restauro de jardins. Em 2006 a Associação concorreu com 12 jardins especiais a um programa de financiamento do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu, o EEA Grants, submetendo um projecto de restauro das estruturas hidráulicas, muros e pavimentos desses jardins. O projecto foi aprovado e realizado tendo terminado em Dezembro de 2010 com a publicação de um livro: A Água nos Jardins Portugueses". O investimento total do projecto foi de mais de 1.000.000 €, a contribuição do EEA Grants foi de 40%. A coordenação foi feita pela Arq. Paisagista Cristina Castel Branco.
Quais foram os jardins restaurados?
Foram jardins em todo o país, incluindo os Açores. A intervenção foi sobretudo na recuperação das estruturas hidráulicas, de modo a optimizar a rega reduzindo o consumo de água ou recuperando fontes próprias de água (minas, cisternas de recolha de águas pluviais) ou restaurando o funcionamento de fontes e jogos de água.. Foram feitas intervenções nos jardins do Palácio dos Marqueses de Fronteira, Claustro do Convento do Bom Sucesso, Jardim José do Canto, Quinta da Boa Viagem, Jardim do Paço Vitorino, Jardim da Casa de Juste, Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, Quinta das Lágrimas, Quinta das Machadas, Paço de Belas e Quinta do Senhor da Serra., Quinta de Santo António e Quinta da Francelha.
Qual foi o objectivo de publicar este livro?
O livro descreve os jardins onde as intervenções foram feitas, sendo por isso interessante para quem goste de jardins. Descreve também o levantamento feito previamente à intervenção e a forma como a intervenção de restauro foi feita seguindo as boas práticas consagradas de restauro de jardins históricos. O livro, agora reeditado para venda ao público, pode interessar tanto os profissionais de restauro de jardins como quem goste de conhecer um pouco melhor o nosso património de jardins.
Iole  quando vejo esta tua fotografia encostada à figueira, no teu quintal, lembro-me logo daquele lanche no teu jardim que é um amor e que foi tão bom passar ali a tarde, tomar chá e lanchar o bolo de maçã! Isto significa que estou a pedir um lanche igual, agora que o tempo bom está a chegar...

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